Esse país é ou não é uma piada???
O que esperar
de um país – em se tratando de uma olimpíada – onde o currículo escolar trata a
educação física como um verdadeiro estorvo? Sejamos sinceros, a Educação Física
é vista por muitos como algo que não tivesse nada a ver com o sistema de ensino
(na hipótese de que isso exista no Brasil), tratado como uma disciplina
“complementar” - no sentido de uma banalidade que só “rouba” tempo de
disciplinas que essas crianças deveriam aprender como português e matemática,
as disciplinas de “verdade”, que elas vão “precisar” quando “entrarem” no
“mercado de trabalho”... A estrutura educacional – em sua maior parte – teve a
audácia de sancionar a ideia de que o tempo da educação física é para chutar
uma bola, jogar uma pelada, botar as “crianças pra correr”. Que tipo de
(de)formação podemos conseguir com isso?
E os poderes
públicos não satisfeitos se dedicam a transformar suas redes de ensino em um
grande amontoado de depósitos de gente, que prima pelo conhecimento morto,
incolor, que embota qualquer interesse pelos estudos. Nossas escolas são piores
que as “escolinhas” dos clubes falidos do país: que escola é essa que não
promove arte, que não abraça o esporte, que se recusa a fomentar um
conhecimento vivo, prazeroso e que tenha alma?
O que esperar
de um país onde mesmo os clubes de futebol fazem questão de recrutar os seus
jovens jogadores nos mais dantescos grotões do país, de maneira proposital,
para auferir o maior lucro possível, explorando, extorquindo o futuro dessas crianças à preço de banana, de maneira acintosa e com
total cumplicidade da maioria dos pais. Até dizer chega. Ou até
que um desses garotos quebre a perna, o pé ou o joelho. Sendo então
descartados, porque os clubes fazem o favor de não dar qualquer cobertura,
plano de saúde (hahaha) ou assistência. Esses garotos ao se virem
“inutilizados” para a prática do futebol ficam ao léu. Que voltem para o grotão
de onde vieram e busquem outra forma de vir para conquistar o “sul”, tal como
as novelas da grobu tanto mostram. Os
clubes reproduzem os mesmos esquemas do doce capitalismo brasileiro. Onde
arcaico e moderno são faces da mesma moeda. Um capitalismo de taxas de mais
valia de primeiríssimo mundo conjugadas com uma exploração de mão de obra de
fazer inveja a alguns rincões da África e do sudeste asiático. Esquema esse
viabilizado fundamentalmente pelo baixíssimo valor da força de trabalho.
O nome disso
meus caros não é outro senão exploração desavergonhada de mão de obra infantil.
Uma forma estúpida de extração de mais-valia que vitima as canelas, a infância,
a vida e os sonhos de crianças. Até países da África já tem combatido esse
negócio escuso. Aqui, nossos dirigentes tem a coragem de dizer que suas
“escolinhas” salvam esses jovens. Sabendo todos – outro agravante – que os
próprios clubes se tornaram verdadeiras plataformas de empresários.
Capitalistas da bola. Mercadores de almas de crianças que veem no futebol uma
possibilidade de ascensão social. Agradeçamos a Pelé. Que com sua Lei abriu as
porteiras do Futebol brasileiro para a farra de empresários, que fazem fortuna
às expensas da exploração de uma massa de jogadores de futebol que, segundo
estatísticas, não ganham mais do que um salário mínimo. Estamos falando de 90%
de jogadores profissionais. Todos filiados. Agora imaginem essa garotada (que podem
ser contada aos milhares) que nem nessas estatísticas estão incluídas.
Agradeçam ao Rei. Se calado já era um verdadeiro poeta, fazendo leis então,
conseguiu destronar Camões e Drumond (não o Luizinho, mas o Carlos...) no
panteão da língua pátria. Depois dessa, como confiar no Rei?
Como esperar
salvação de clubes falidos, em petição de miséria? A situação ganha contornos
burlescos se examinarmos a situação de alguns dos principais clubes do país.
Basta nos determos às rasas informações de jornalistas para se dar conta do
abismo no qual estão afundados o futebol e o esporte de uma maneira geral –
talvez com a exceção heroica do vôlei.
Como esperar
algo, por exemplo, de um clube famoso da Colina que tem entre seus credores o
cartunista Ziraldo? O mesmo clube que chegou a estampar como patrocínio da
manga de sua camisa a dupla Henrique e Diego. Uma dupla sertaneja.
Uma dupla
sertaneja...
Covardia fazer
chacota aqui da situação do Flamengo que outro dia teve os telefones cortados
por falta de pagamento. Cuja diretoria aconselhou Deivid a entrar na Justiça
(contra o próprio Fla) para receber seus atrasados. Levando o coitado a entrar
numa fila de credores que têm desde Rodrigo Alvim – que jogou (sic) 5 partidas
em dois anos, passando por Romário, Petkovic até Evaristo de Macedo. Pasmém, o
velho Evaristo, atacante do Fla na década de 50. Década de 50...
Situação não
menos inusitada foi outro dia um dirigente do Botafogo revelar que uma das
principais fontes de receita do clube se constituir na cessão do gramado do Engenhão para
a disputa de peladas. Eu disse peladas. De pagodeiros, artistas de televisão,
ex-BBBs, ex-jogadores, políticos, pilotos de corrida. Não sei como ainda não
chamaram os 33 mineiros do Chile...
Um dado
emblemático: ainda hoje vários clubes do Rio de Janeiro utilizam cabras e
cabritos para aparar a grama de seus “estádios”. Como em Moça Bonita. E, aliás, onde vários
jogos foram interrompidos no último campeonato carioca por pipas... Parece
brincadeira. Vocês conseguem imaginar algo parecido ocorrer em outros centros:
um jogo no Nou Camp parar porque uma linha com cerol atingiu Messi; que uma
cabra é a responsável pelo tapete do campo do Giuseppe Meazza de Milão; que o Manchester United garante uma
graninha cedendo o Old Trafford para
peladas.
Depois disso
podemos esperar que tais clubes possam contribuir para a edificação nesse país
de algo chamado esporte?
Se assim é com o futebol, paixão nacional,
tal como o arroz e feijão, imaginem os outros esportes. A começar pelo futebol.
Só que o feminino. Para se ter uma ideia da falta de apoio à seleção brasileira,
as meninas jogaram com um uniforme velho, que já saiu de linha. A CBF, que paga
religiosamente 100 mil reais ao ex-presidente Ricardo Teixeira, que fugiu para
Boca Ratón, não teve a pachorra de separar uma dúzia que fosse de novas camisas
para distribuir para as jogadoras defenderem as cores do país. E é dessas
meninas que muita gente cobra medalhas. Resultados. É dessas meninas que se
exigiu que ficassem de luto depois da eliminação para o Japão. Como se algum
brasileiro pudesse cobrar algo de um atleta. E ainda mais atletas como essas,
que não são mais do que trabalhadoras humildes, abnegadas, gente do povo. E que
são solenemente ignoradas pela mídia e pela população durante 3 anos e 11 meses
e só lembradas nas Olimpíadas. E só valem alguma coisa se trouxerem ouro. Caso
contrário o país lhes oferece o que tem de melhor: seu retumbante desprezo.
É impressionante o número de depoimentos de
atletas que dizem o quanto lutaram para estar em Londres. A começar pelo fato
de que não tinham o que comer quando pequenos. A falta de apoio, de estrutura,
de investimento etc., são os outros obstáculos a serem superados para quem se
atrever a seguir com a loucura de se tornar atleta nesse país. Conta-se nos
dedos os centros de treinamento em todo o território nacional. Tendo em vista
todas as modalidades. Um nadador carioca, por exemplo, só tem disponível em
toda a cidade uma piscina olímpica. Só a Universidade da Flórida dispõe de
20....
Impossível não lembrar o caso da Keila
Costa, grande atleta do salto em distância, que começou a praticar o esporte
saltando sobre cabritos no terreno baldio perto de sua casa. E por um grande
lance de sorte, acabou sendo descoberta pelo Luciano do Valle, empresário e
dublê de narrador, que ganhou muito dinheiro ao botar o Maguila para apanhar do
Evander Holyfield. Mas com Keila, o Luciano se redimiu. Garantiu para o país o
talento de uma excelente saltadora.
Tudo isso e as Federações cada vez mais
ricas....
O país vai mal. O esporte vai mal. Até aí
nenhuma novidade. Até porque, o Barão de Itararé já proclamara: de onde menos
se espera é que não sai nada mesmo. Agora o que causa espanto é a virulência da
cobrança de segmentos da sociedade sobre esses atletas. Um sem número de xingamentos.
De manifestações de racismo. De insultos. Assédio moral deslavado. Esses atletas têm de ouvir ataques que a população é incapaz de fazer a quem rouba o erário público, a quem recebe propina, a criminosos do colarinho branco. Triste. Deprimente.
Talvez o único consolo é saber que Phelps se
aposentou. Esse não vai continuar a dar uma surra no país. Mas tem tudo para
continuar sendo surrado por potências como Coréia do Norte, Hungria, Quênia,
Jamaica, Etiópia, Cazaquistão e Nova Zelândia. Para 2016, que todos comecem a
se apegar a sua fé. Seja ela qual for. Pois só um milagre para salvar o país de
um vexame olímpico. Só um milagre. Um milagre olímpico...
(mal havia postado esse texto, e os jornais da manhã do dia 07/08 estampavam: o clube da Colina era denunciado pelo Ministério Público pelas péssimas condições do centro de treinamento (risos) de suas categorias de base. Salas sem ar-condicionado, comida estragada, banheiros infectos, jovens tendo que beber água do chuveiro, camas sem estrado. A Justiça determinava o imediato fechamento dessa Dachau de canelas e sonhos de crianças...onde no início do ano, o jovem Wendel acabou morrendo de ataque cardíaco.)
Leonardo Soares, professor e esta a espera de outro milagre: que o Governo Dilma valorize a educação pública!!
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